A fotografia era de um menininho de três ou quatro anos. Um lindo menino sorrindo feliz para a lente da câmera. Um menininho com os cabelos castanhos e olhos azuis tais quais os de Arthur...
Pisando firme, ele atravessou a sala para arrancar a fotografia das mãos dela, o olhar era frio. Ela engoliu em seco.
— Desculpe... Ele é lindo.
— Sim, ele era.
Era. Então aquele era o filho de Arthur. Lua sentiu um aperto no peito ao pensar que aquela vida e aquela meninice feliz não existiam mais. Como aquilo devia ser duro para Arthur...!
— Desculpe — disse novamente.
Ele pôs a fotografia sobre a mesa com cuidado antes de olhar torto para Lua.
— Você sabe quem é ele?
— Eu... Sim — ela admitiu, relutante. — Uma das meninas me contou que você tinha um filho.
— Luke — ele respondeu, com raiva. — O nome dele era Luke.
Luke... Quatro anos. A morte dele foi demais para os pais, que se separaram, incapazes de lidar com o problema juntos.
— Desculpe mesmo — repetiu. — Eu não devia... Por favor acredite quando lhe digo que nunca quis...
— Quis o quê? — perguntou ele, levantando o queixo de maneira arrogante. — Intrometer-se? Meter o nariz onde não foi chamada?
Diante daquela fúria, Lua se encolheu.
— Não foi nada disso — protestou. — Eu só vi a fotografia e... — e o quê? Ela não estava mesmo se intrometendo? Bem... sim. Mas sem a menor intenção de irritá-lo. Só estava curiosa.
E por isso ela atraíra mais uma vez a raiva de Arthur. Nada de novo nisso. Mas certamente ele sabia que Lua não tinha a intenção de fazê-lo sofrer. Mesmo que parecesse o contrário.
— Desculpe de verdade — disse mais uma vez, firme, antes de passar por Arthur para ir até a cozinha, sentindo que o melhor era deixá-lo um pouco sozinho.
Parecia que era uma tarde de irritações. Para Arthur, no que dizia respeito ao filho, e para Lua, toda intrigada e curiosa sobre a mulher naquele quadro e sobre o homem que o pintou.
Mas ela ao menos era capaz de encontrar respostas para as próprias questões, enquanto Arthur provavelmente jamais entenderia por que o filho, um menininho de quatro anos, teve de morrer.
Talvez fosse uma questão de fé. E a morte de uma criança certamente questionava a fé de qualquer pessoa!
Ela levantou o olhar, nervosa, alguns minutos mais tarde, quando Arthur voltou para a cozinha. Ficou satisfeita porque ele recuperara um pouco a cor e parecia menos mal-humorado.
— Tirei os ovos e o leite da geladeira. — Lua apontou para os ingredientes sobre a bancada. — Não sei do que mais você precisa.
Ele tirou o paletó e o colocou sobre um balcão antes de pegar uma frigideira que ficava pendurada sobre um balcão no meio da cozinha.
— Queijos ou cogumelos? — ele perguntou, ríspido, ao quebrar os ovos em uma vasilha.
Lua teve de engolir em seco por causa da náusea que estava sentindo.
— Sem nada, pode ser? — ainda era estranho estar ali no apartamento dele de novo, e ainda mais deixando que ele cozinhasse para ela.
Kate, que a vira sair, ficaria mais do que curiosa quando Lua voltasse para a galeria!
Arthur estava impaciente ao esquentar o óleo na frigideira e bater os ovos, antes de acrescentar o leite. E estava arrependido por ter se oferecido para cozinhar para Lua.
Ele jamais conversara com alguém sobre Luke. Não conseguia. Três anos depois, ainda sofria demais com a morte do filho para falar sobre o assunto. Era por causa desta dor que Arthur e a ex-mulher, Sarah, deixaram de falar um com o outro, nenhum dos dois parecia capaz de pensar em outra coisa quando estavam juntos e, sem conseguir colocar a emoção em palavras, a coisa
toda era insuportável. Por isso Arthur certamente não pretendia conversar sobre Luke com Lua, uma mulher com a qual passara apenas uma noite!
Ele pôs os ovos batidos com leite na frigideira e os deixou cozinhar um pouco antes de virar-se para Lua.
— Garfo e faca estão... Ah, que droga! — praguejou, ao ver que ela, pálida, saía correndo da cozinha com a mão na boca.
Lua mal conseguiu chegar ao banheiro da suíte, ironicamente o único cômodo que ela conhecia, e começou a passar mal.
Foi por causa do cheiro dos ovos na frigideira. Aquilo lhe incomodara o estômago sensível e o enjôo foi incontrolável.
— Aqui — disse Arthur, colocando uma toalha úmida sobre a testa de Lua. Aquilo era tão humilhante!
Mas não tanto quanto aquela manhã, há seis semanas, quando ele quase a expulsou.
Agachada e segurando a toalha sobre a testa, o enjôo parecia ter passado. Agora, por que Lua estava se sentindo enjoada sem ter comido nada, a não ser pela barra de chocolate que Arthur lhe dera, ela não sabia!
— Esta se sentindo melhor? — ele perguntou.
— Um pouco... Obrigada. — ela não conseguiu olhar para Arthur.
E só lhe causara problemas naquela manhã. Estava certa de que ele estava louco para se livrar dela.
— Vou só lavar meu rosto e então vou embora.
Lua provavelmente comeria feliz aquela omelete agora que se livrara do que quer que estivesse lhe causando aquele enjôo. Mas, diante das circunstâncias, era melhor não ficar.
— Acho que não, Lua.
Ela levantou o olhar e o encontrou encarando-a, frio e com as mãos na cintura.
— Como assim? — perguntou Lua, intrigada.
— Acho que você não vai sair daqui tão cedo.
Ela arregalou os olhos.
— Mas estou lhe dizendo que me sinto melhor.
— Sim, eu sei disso — ele respondeu, ríspido. — É curioso, mas mulheres na sua condição realmente se sentem melhor depois que vomitam — acrescentou.
Lua franziu a testa.
— Minha condição?
Arthur respirou fundo, observando-a como se quisesse estrangulá-la.
— Lua, a não ser que eu esteja muito enganado, e Deus sabe que eu quero estar! — ele murmurou, mal-humorado. — A verdade é que você desmaiou há pouco sem motivo...
— Eu vi um retrato da mãe que jamais conheci! — defendeu-se, incrédula.
— O fato de você ter desmaiado, e mais a sua tontura matinal e o enjôo, tudo me faz chegar a uma única conclusão.
— Faz...?
Um tremor percorreu-lhe todo o corpo e se deteve no estômago.
— Você está grávida, Lua — disse Arthur, de repente — Na sexta semana de gestação, eu diria! — acrescentou, mal conseguindo conter a fúria.
Grávida!
Mas não podia ser!
Podia...?
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