Era algo sério demais para Lua. A mãe biológica dela estava morta.
Ela jamais pensara em tal possibilidade. Quando ficara sabendo que era adotada, antes de se dar conta de que aquilo não era importante, imaginara várias razões por que a mãe a entregara à adoção. Talvez fosse jovem demais, uma mãe solteira, ou mesmo uma mulher casada que não seria capaz de
sustentar outra criança na família. Mas morta, Lua jamais imaginara! A mulher do retrato, tão jovem e cheia de vida, morrera no parto? Não parecia possível. Era uma crueldade que não podia ser permitida.
Assim como a morte de Luke, o filho de Arthur... Lua se virou para ele, que lhe deslizava a mão por sobre o ombro.
— Não posso... — ela balançava a cabeça. — Não posso acreditar. Arthur, você consegue?
Ah, ele acreditava sim, claro. O problema não era acreditar naquela história. Arthur olhou fixo para os pais de Lua.
— Você estão dizendo... Vocês estão querendo nos dizer que Lua pode ter o mesmo problema de saúde que a mãe dela durante o parto do nosso bebê? — ele percebera a importância daquela informação, mesmo que tenha passado despercebida por Lua.
— É uma possibilidade — foi Henry quem lhe respondeu. — Entende agora por que precisávamos contar-lhes?
— O que eu entendo é que vocês deveriam ter contato no sábado, e não esperado até agora...
— Arthur! — repreendeu Lua, emocionada. Mas ele balançava a cabeça, impaciente.
— Desculpe Lua, mas seus pais sabiam o tempo todo que sua mãe morrera durante o parto, sabiam que havia um risco de o mesmo acontecer a você e, mesmo assim, só agora... Ele se interrompeu, olhando torto e intrigado para o casal.
Havia outra coisa importante que Maria não contara sofre a mãe de Lua...
— Como você sabia que a mãe dela era, nas suas palavras, tão delicada e tão pequena? — perguntou astuto.
— Você é um homem inteligente, Arthur — elogiou Henry, com aspereza. — Nós sabemos disso tudo porque Claudia, a mãe de Lua, era nossa filha.
Foi a vez de Arthur ficar sem palavras. E se ele estava paralisado com tal notícia, como Lua estava se sentindo?
Mas Arthur estava enganado. Ela não parecia em choque quando ele olhou na direção dela. Ao contrário, havia um brilho de entusiasmo nos olhos dourados quando ela se virou para ele, com uma expressão algo ansiosa.
— Pode pegar o retrato, Arthur? — ela pediu, numa voz claramente animada.
— Retrato? — Arthur franziu a testa, confuso.
— O retrato, Arthur— ela disse, firmemente.
Por que raios Lua queria o retrato àquela hora? Por que mostrar aquilo para os pais adotivos, seus avós? Eles estavam falando sobre a mãe biológica dela, e não de Lua, droga!
Arthur ficou paralisado.
— Lua...? — ele perguntou, devagar.
Ela assentiu.
— Por favor.
Arthur foi até o quarto quando, como num sonho, uma verdade, uma verdade surpreendente, o atingiu bem no meio dos olhos. Uma verdade que ele desprezara. Ele xingara Lua de mentirosa ao mencionar aquela verdade.
— Está tudo bem, querida? — perguntou a mãe de Lua, ansiosa, quando ficaram sozinhos. — Não deveríamos tê-la enganado, eu sei...
— Estou bem — disse Lua, afetuosa. — Mas não sei quanto ao Arthur — acrescentou, ao ver que ele parecia arrogante ao sair em direção ao quarto.
— Você não está irritada ou triste, sentindo que nós a decepcionamos, porque este tempo todo nunca lhe contamos que somos seus avós e não seus pais adotivos? — perguntou Maria, emocionada.
Era um pouco estranho, Lua tinha de admitir, mas ao mesmo tempo fazia sentido. A mãe, Claudia, morrera durante o parto, por isso os pais de Claudia cuidaram dela. Lua se levantou para abraçar aquelas que pessoas que eram os únicos pais que conhecia. Pessoas boas e generosas que a amaram e cuidaram dela a vida toda. Como ela poderia ficar com raiva deles? Sabia que eles haviam
feito aquilo tudo por amor, e nada mais. Sorrindo, com lágrimas nos olhos, Lua disse:
— Como poderia me irritar com vocês? Vocês fizeram o que era o melhor, sei disso.
— Mesmo assim, devíamos ter contado antes — confessou Henry, pesaroso. — Mas nós perdemos a Claudia, e você... Você era tão parecida com ela quando era um bebê. — a voz dele ficou rouca de emoção. — Uma coisinha pequena, com um tufo de cabelo loiro. Nós a amamos assim que a vimos. E parece que erramos com a Claudia. Por isso queríamos ter uma segunda chance com você.
— Uma segunda chance...? — foi a vez de Lua perguntar, curiosa, antes que Arthur voltasse à sala com o quadro.
Ela se pôs ao lado do noivo, do outro lado da sala.
— Coloque-o em cima do sofá, Arthur — pediu, percebendo, pela expressão mal-humorada dele, que ele não estava nada satisfeito com a explicação dos pais dela.
Bem, talvez quando ambos vissem o retrato de Claudia, Arthur teria uma explicação que aceitaria!
Assim que apoiou a pintura no sofá, ele viu Maria gemer sofregamente, virando-se para observar Henry, que se aproximava para olhar mais de perto, as rugas na testa o deixando ainda mais velho. Henry estendeu a mão, do mesmo modo que Lua fizera quando vira o quadro pela primeira vez, sem tocar a moldura, mas quase acariciando os contornos do belo rosto.
— Diga-me, Papai — disse Lua, colocando-se ao lado dele. — A Claudia tinha uma marca de nascença?
— Tinha — foi Maria quem respondeu, juntando-se à filha e ao marido. — Uma marca em forma de rosa. Bem... Aqui! — ela gemeu ao ver o retrato inteiro. — Claudia...! — gritou, chorando completamente agora. — Mas, como...?
— Este é o quadro sobre o qual lhes falei no sábado. O quadro que Arthur descobriu escondido na casa de um homem que morrera — explicou Lua, feliz.
—A casa de Jack Garder — acrescentou Arthur, querendo ficar tão feliz quando Lua com aquela história toda.
O retrato, claro, era de Claudia Blanco, como Lua sempre dissera. A reação de Lua e Maria era sincera demais para ser fingimento. Mas, nesse caso, não havia sentido nas coisas que Arthur acusara Lua. Acusações, aliás, que ela sempre negara. Ele a chamara de mentirosa. Uma mentirosa e uma aproveitadora...!
Henry virou-se para perguntar:
— Este é o quadro de Andre Souter sobre o qual você falou?
— Sim — respondeu Arthur.
— Há 27 anos, Claudia ficou noiva de um homem chamado Jack Garder. — Maria suspirou. — Ele era muito mais velho do que ela, 30 anos, mais ou menos, mas ele era muito rico e, quando a pediu em casamento, ela aceitou.
— E então ela conheceu Andre Souter e se apaixonou pelo pintor — completou Arthur, mal-humorado.
Tudo aquilo de que acusara Lua, na verdade. Acusara e a punira. O ciúme que sentia dos outros homens fez com que ele quisesse que Lua tivesse certeza de que ela era dele, a fim de que
se esquecesse dos outros. Meu Deus, ela deve odiá-lo!
Naquele momento, Arthur não podia nem mesmo olhar para Lua. Precisava de tempo para reavaliar toda a situação. Mas tempo, parecia, era algo de que ele não dispunha.
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